Ossos

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“Nós ossos que aqui estamos pelos vossos esperamos”- Capela dos Ossos, Évora, Portugal.

Não deveria ter entrado naquela capela depois dos quarenta. Uma amiga, aos trinta, a prevenira.

Ossos. Empilhados nas paredes do santuário. O teto, poupado, era o alívio a quem buscava retomar o fôlego, roubado à entrada. Sentiu medo. Do fim.

Foi subitamente tomada pela ansiedade e pela angústia, por não saber se vivera além do que a si havia sido destinado. Por não saber se desafiara o arbítrio de ser livre. E enquanto a liberdade era o seu afã, contava, em silêncio, os anos que transcorreram até aquele exato dia.

Olhou novamente ao redor, e intrigada, pensou nas histórias que unidas intrinsicamente aos milhares de ossos, jaziam. Mortas.

Ali permaneceu tempo suficiente para, então, despedir-se, fitando o horizonte. Partiu pensando em suas vivências, os alicerces necessários à própria alma, que retida, ansiava vastidão. Entendeu que o medo da morte era imprescindível às escolhas da vida e seguiu caminhando por dias. E anos. Sentindo-se viva. E livre.

Naquele dia, soube que poderia morrer, se assim fosse o desígnio. Preferiu viver. Corajosamente.

Aline Serfaty

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Revisado por Fabiana Serra 

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8 comentários sobre “Ossos

  1. O pior da morte é não ter realizado tudo que se quis. E o que é realizar tudo? Talvez saber que a gente fez a diferença de alguma forma no mundo. Que a gente deixou alguma marca bacana nas pessoas com quem convivemos.
    Amei a forma de você explorar esse tema.

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