O Caçador de Cores

Passos rápidos, ritmados, pernas direitas à frente, esquerdas atrás. O estalido dos calçados chocando-se ao solo, marcando o compasso. Mãos no bolso. Escondidas, procuram conforto. Pensamentos monótonos. Divagações mudas. No breu da noite, poderiam ser negros, brancos, pardos. São humanos. Daqui do outro lado da rua, percebo seus anseios, vermelho vivo. Vislumbro uma dor escarlate, um desconforto cinza escondido na marcha, no bolso, no olhar, na mente. Desnudo seus pensamentos e imagino um arco-íris mental de decepções, obrigações, desejos, esperança. Olho de novo e não vejo mais nada. Passaram? Sim, passaram. Volto a ouvir sirenes e motores, volto a sentir frio. E nessa confusão, caminho com a câmera em mãos. Pensando no colorido que nos dá a identidade da pele, que nos abre ou fecha as portas da vida, que nos define. Escolho fotografar o que vejo em preto e branco, descolorindo aparências. E sigo adiante imaginando a humanidade e seus universos individuais com as cores que realmente importam.

The Color Hunter

Fast, rhythmic steps; right legs forward, left legs backward. The snap of shoes tapping against the ground, setting the tempo. Hands in their pockets, hidden, looking for comfort. Monotonous thoughts. Mute digressions. In the pitch of the night, the men could be black, white, mixed skin. But they’re humans. From the other side of the street, I can see their bright red yearnings. I glimpse a scarlet pain, a gray discomfort hidden in their march, in their pockets, in their gazes and in their minds. I uncover their thoughts and imagine a mental rainbow of disappointments, obligations, desires, hope. I look again and see nothing. Did they pass me by? Yes. I hear sirens and engines again, and feel the cold. And in this confusion, I walk ahead with the camera in my hands. Thinking of the color that identifies us through our skin, that open or close the doors of life, colors that define us. I choose to photograph in black and white, discoloring appearances. And I go on, imagining humanity and its universes in the colors that really matter.

Aline Serfaty

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Fotografia por Syed Hoda

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6 comentários sobre “O Caçador de Cores

  1. “As cores que realmente importam” – gostei dessa frase, principalmente no contexto em que ela foi usada. Vale uma bela reflexão. Quem sabe pode até virar um novo conto… penso nas inúmeras possibilidades e percebo que ainda há tempo. Tempo de redefinir, aprender, enfrentar.
    Minha querida irmã, que orgulho quando vejo a sua sensibilidade tão bem traduzida!

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    1. Não poderia ter outra irmã. Única, maravilhosa. O orgulho é meu também! E nós duas, com origens e cores parcialmente diferentes, conseguimos nos alinhar ao que realmente importa: o amor. Sorte de te ter ao meu lado.

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    1. Lindo, Paulo! E real. O que seria das “escuridões” que nos habitam, não fosse o brilho dos olhos e da alma? E as lágrimas, transparentes, lavando com emoção as cores que não mais importam. Obrigada por comentar! Sempre com sensibilidade!

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