Sentença

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Eram seus últimos minutos. Naquele instante, tomado pela nostalgia oriunda das circunstâncias a ele impostas, relembrou os segundos que uma vida inteira representa quando se está próximo ao fim. Aliada à incerteza, a angústia se fez presente em seu coração, parecendo apertá-lo, torcê-lo, esmagá-lo. E em seus pensamentos pairava a sentença, sussurrada ao travesseiro, derradeiro companheiro do leito terminal – “culpado”.

Taciturno, franzindo a testa e estreitando o olhar, percebeu-se inserido em sua própria retrospectiva, composta por precoces lutas e vitórias. Lembrou-se do trabalho árduo e do reconhecimento através de prêmios e títulos. Pensou na dedicação que lhe rendeu os mais altos postos aspirados por seus pares, em detrimento do que ao final, pareceu faltar-lhe. Seu par.

Então, lembrou-se dela. A última mulher. A última paixão. Significativa conexão perdida entre o passado e o presente. Sempre presente. Lembrou-se do seu sorriso, o mais belo e sincero. Pensou no medo, nas incertezas e na necessidade de permanência que o fizeram deixá-la passar. Escapar. À época, tudo pareceu-lhe uma profunda desordem. No entanto, hoje sabe que desordenados eram seus pensamentos. Julgou-se por ter sido soberbo e até grosseiro. Por ter falado sem se ouvir. Condenou-se culpado pelos sentimentos escondidos, camuflados. E por ter silenciado. Por fim, perdoou-se por se reconhecer humano.

Solitário, observando internamente o trânsito entre o que viveu e do que se arrependeu, descobriu que sua sentença não fora a morte. Mas o tempo, que passou célere. O tempo perdido cultivando o pobre ego, faminto por conquistas e pedestais. Ansiando por aplausos, que fortes e em uníssono, marcaram o compasso da sua vida, ensurdecendo e ocultando sua maior fraqueza – a própria estima. E nesse caminho que trilhou, raros foram os que o perceberam tão profundamente. Entre eles, ela. A última mulher. 

Aline Serfaty

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Revisado por Fabiana Serra 

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