A Próxima Estação

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Observá-lo era parte da sua rotina e os cinquenta metros quadrados que abrigavam o escritório de finanças no qual trabalhavam passara, também, a ser o cenário dos seus devaneios. Eram os protagonistas do roteiro repleto de volúpia, ambientado na mesa da sala vazia ou nas escadas de emergência. Nada parava sua imaginação, que através de seus olhos cor de mel, convertia mistério em sedução, ilustrando as tórridas histórias que passaram a preencher os minutos do seu dia.

Foi assim durante todo aquele inverno. Encontrara algo para se aquecer. Algo para se distrair. No entanto, ao final do dia, sabia que todas as sensações eram oriundas de seus pensamentos e que, apesar da diversão experimentada imaginando-se em toda sorte de posições e locais com aquele homem, nada havia se tornado real. Nem um olhar que pudesse flagrar-lhe. Nem um toque que pudesse eriçar seus pelos e acelerar seu coração. Nada. 

Beirando a desistência, resolveu investir sua última ficha naquela, até então, mal contada história. Colocou energia e olhou em sua direção por toda a manhã, sinalizando claramente seu desejo. Ele se levantou para ir ao banheiro. E depois para beber água. E mais uma vez. Em sua direção caminhou e perguntou-lhe: “Hoje, você pode?”. Sem titubear, ela lhe disse que sim e acertaram os detalhes. 

Enroscaram-se em beijos logo que ele chegou, ainda nos limites do carro. Ali permaneceram até que o espaço lhes pareceu pequeno. Subiram ao apartamento buscando conforto, testando limites e extravasando o que havia ficado retido por toda uma estação. Quando tudo parecia ter terminado, algo despertava-lhes novamente a centelha necessária ao fogo. E foi assim, por alguns encontros, obedecendo ao desejo que, inevitavelmente, provocava ações.

Dias depois, no escritório, ele lhe trouxe uma flor que comprara de um ambulante. Entregou-lhe com um franco sorriso no rosto. Ela ainda confusa e surpresa com o gesto, agradeceu-lhe, deixando escapar aos mais atentos, um traço de decepção. 

Naquele dia, enterrou o amante que habitara seus pensamentos e descobriu um romântico. Tomada por súbito desconforto, subiu rapidamente as escadas para o andar mais alto do prédio. Vigésimo, pensou. Enquanto as pernas ainda tremiam pelo extenuante exercício, arrancou coragem das batidas fortes do coração e olhou para baixo através da grande cortina de vidro. Sentiu o sangue percorrer cada centímetro do seu corpo. Uma panaceia. Por fim, respirou fundo e voltou pelo largo corredor cuja passagem dava lugar a funcionários apressados. Ainda com a flor em mãos, procurou o bebedouro e, generosamente, encheu um copo, depositando-a ali. Para a flor, o insípido, inodoro e incolor pareceu-lhe perfeito. 

Para si, a próxima estação. 

Aline Serfaty

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Revisado por Fabiana Serra 

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2 comentários sobre “A Próxima Estação

  1. “Ela” me deixou confusa. Será que só quer aventura, dar vazão aos desejos, ou somente sentir o gosto da conquista? Ou então, será que ela tem certeza de que o romantismo diminui o risco? Desacelera o coração? Acho que ela precisa viver mais e apreciar o amor.

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