
Parecia estar esperando – alguém. Abriu a porta e espreitou. Olhou ao longe, buscando… O cenário e ele eram peças de um quebra cabeça que não se encaixavam. As pichações com letras gordas, cheias, impunham ao muro os rótulos da modernidade. E ele ali no meio, enquadrado, observava. O chapéu escondia parcialmente seu olhar. Sua expressão passeava entre o plácido e o bruto. Ergueu os olhos e franziu a testa, deixando evidente as rugas do cenho. Parecia querer dizer algo. Mas nenhuma palavra se fez ouvir. Da esquerda para a direita, varreu a paisagem e suspirou. “Sim, o mundo ainda está aqui fora”, pensou. Atrás de si, bateu a porta. Mergulhou em seu universo sereno e esperou por mais um dia. Para abrir as mesmas portas – da vida – que passou.
The Old Man and the World Outside
He seemed to be waiting. For someone. He opened the door and peered out, looking into the distance, searching. The man and his surrounding scenery were pieces of a puzzle that did not fit together. The graffiti in fat, full letters imposed signs of modernity on the walls around him. While he stood in the middle, framed, watching. The hat partially hid his gaze. His expression wandered between placid and brute. He raised his eyes and frowned, revealing wrinkles in his brow. He seemed to want to say something. But no word was heard. From left to right, he swept the landscape and sighed. “Yes, the world is still out there”, he thought. Behind him, he slammed the door and plunged into his serene universe. And waited for another day. To open the same doors – of a life – that had passed.
Aline Serfaty
facebook.com/contocurtasetcetera
Fotografia por Syed Hoda
O olhar sutil da escritora escancara a sensação de anacronismo e de solidão da personagem em relação à sociedade moderna, que nos coage a ter ternura por alguém que não conhecemos. Bravo!
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Paulo, que fantástico seu comentário! Obrigada!! Sinto que foto e palavras dessa curtíssima mexeram com você tanto quanto comigo.
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Muito bom! A velhice pode ser muito estranha …
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Muito bom! A velhice pode ser muito estranha…
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Sim… Mas mais do que no corpo, percebo que a velhice está nos pensamentos retrógrados e na falta de resiliência que pode existir em cada um de nós. Coragem para pensar, olhar e ser diferente!
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Mais um conto-vertigem, Aline… Saio dele também assombrada com os descompassos, não só dos velhos, da velhice… De uma realidade em convulsão – paradoxalmente tão ‘a mesma’ e tão (in)diferente. Viver é um espanto cotidiano?
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Apaixonei…vi meu pai nessa espiada…fantástico
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Um conto sutil que nos faz refletir como é ser um velho e se sentir excluso do mumdo. A velhice está logo ali adiante e encará-la é difícil, principalmente num mundo em que tudo que é novo é melhor e o velho descartável .
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