Saiu do banho, abriu o armário e escolheu a roupa que usaria. Maquiou-se, combinando cores e acessórios. Desceu, impecável e entrou no carro. Era a primeira vez que se encontrariam. A sós.
Há meses flertava-o. Atirava olhares que encontravam seu corpo e marcavam seus gestos, mas que pareciam não ser percebidos. Foi em uma tarde como qualquer outra que ele aquiesceu e convidou-a para sair. Naquele fatídico dia, tudo começou. Logo, tornou-se a pessoa para a qual ela vestia-se e para quem direcionava pensamentos e ações. Em pouco tempo, ele não estava mais ao seu lado. Estava dentro. E por isso, pulsava forte. Era incontrolável. Apaixonara-se.
Demorou até que ele também se envolvesse. Juntos era intenso, único. Para ela. Para ele, nunca se soube. Recluso em pensamentos, era incapaz de se expor. Vivia de acordo com suas regras morais, que envolviam traição, mentiras e egoísmo. Usava frequentemente uma roupagem sensível com pegada romântica que a confundia. Dividiam intimidades, mas não eram capazes de dar as mãos. Nunca diante de outras pessoas. Para ele, não havia envolvimento completo, cúmplice. Ou talvez isso era o máximo que doaria. Viviam uma relação de agonia, na qual a certeza do fim era diária. Faltava-lhe coragem. Afinal, algo nele a preenchia. Algo nela o mantinha próximo.
Com franca alegria, ela hoje conta que o destino os desuniu. Nunca mais se encontraram. Sabe-se que constituiu família, tornando-se pai exemplar e caloroso. No entanto, quem o conhece a fundo acredita que não passe de balela. Há alguns anos, apaixonou-se por música e canta regularmente em uma banda aos finais de semana. Através das letras recita amor e expressa em acordes sua sensibilidade. Faz dueto com sua mãe, mulher que exibe impecáveis corpo e tez e arranca olhares fortuitos dos senhores e jovens rapazes que os assistem. Formam um belo par. Sempre de mãos dadas.
*Foto tirada em Oslo – Noruega, no Gustav Vigeland Park.
Aline Serfaty
facebook.com/contocurtasetcetera
Revisado por Fabiana Serra
Adorei. Homens como “ele” se camuflam e nos atordoam. Dissimulados. Ou talvez sejam apenas covardes, que não conseguem se entregar e precisem estar sempre no “controle” da situação.
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Sim, são receosos do “inteiro”. E assim seguem espalhando “metades” por aí. Prefiro sentir. Sempre.
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