Seria mais um dia como outro qualquer, não fosse aquele anúncio publicitário. Não fosse a rosa vermelha e os incontáveis corações que viu ilustrando vitrines por todo o caminho que percorreu. Não fosse a voz do locutor da rádio que anunciava seu suposto amor a uma suposta namorada. Não fosse nada disso, ele teria apenas ido trabalhar. E teria se esquecido que no Brasil, era o “Dia dos Namorados”.
Sugestionado por todos os apelos, aproveitou o intervalo do almoço para passar rapidamente no shopping e escolher para ela, um presente. Apesar de casado há alguns anos, ainda se rendia ao rogo coletivo dos presentes datados. Entrou na loja de motivos praianos e de imediato identificou-se com um dos vestidos da coleção. Instantaneamente, sem que pudesse evitar, foi invadido pela lembrança da única namorada que nunca fora sua. Ouviu alguém lhe oferecer ajuda e mentalmente perguntou-se “pra quê?”. Naqueles segundos que antecederam sua resposta, ainda teve tempo de desejá-la. De sentir seu perfume, seu contorno. Mas a voz insistente indagou novamente e ele enfim, respondeu:
– Este aqui, por favor. Tamanho “P” – disse-lhe.
Enquanto caminhava com a sacola na mão, tentou trazer seus pensamentos de volta ao aqui/agora. No entanto, cada passo parecia marcar profundamente em si os segundos, meses, anos que não a via. Entrou no carro e a partida no motor deu ignição à onda de realidade que subitamente lhe invadiu. Abriu a embalagem do presente, tentando não danificá-la para enfim, certificar-se do que acabara de fazer. Olhou fixamente a etiqueta e deu-se conta de que comprara o tamanho errado. Não teve dúvida – morreria atordoado pelos inesquecíveis momentos que nunca viveu.
Aline Serfaty
facebook.com/contocurtasetcetera
Revisado por Fabiana Serra
Me veio uma tristeza dura, mas se filtrar, essa dureza tem beleza, se houver sentido nisso, mas pra mim faz. Falo isso pois confesso, também tenho uma namorada que nunca terei! kkkk Genial !
CurtirCurtir